terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Reinventemo-nos, Antes Que Seja Tarde

Sempre me pergunto aonde estão nos levando as invenções modernas tecnológicas. Mais precisamente, o celular, com suas redes sociais ao alcance da mão, ao alcance de um simples clique. Para onde estamos indo? 

É tudo muito fantástico demais. Ali, na palma da mão, você tem o mundo ao seu dispor. Ali, na palma da mão, você pesquisa, diverte-se, aprende, comunica-se com o mundo inteiro, e informa-se, informa-se, informa-se. Para onde vai esse excesso de informação? E essa comunicação toda? Estamos realmente sendo mais próximos das pessoas, tendo mais amigos? 


Bem, desnecessário rebater este tema já tão batido, qual seja: temos necessidade de nos comunicar com quem está longe, enquanto esquecemos de nos relacionar com quem está juntinho? É um paradoxo. Mas é assim que estamos caminhando. Pais que não dão atenção aos filhos, filhos que não dão atenção aos pais, porque já não tiveram atenção deles. Crianças viciadas já em tenra idade... e vai por aí.

O fato é que a comunicação virtual está ganhando a parada. Estamos (e eu me incluo) cada vez mais viciados. E a pergunta é: quem ganha com isso? Nós? Temos mais qualidade de vida por isso? Temos vidas mais plenas graças a essa tecnologia? Estamos mais inteiros?



Não sei você, que me lê, o que dirá, mas a minha resposta é um taxativo NÃO. Não temos mais qualidade de vida, não temos vidas mais plenas, não estamos mais inteiros, ao contrário. Estamos mais divididos, fragmentados, com nossa mente flutuando entre os mais variados assuntos, vivendo cada vez mais o mundo mental, o mundo irreal. O vício do celular nos tira do presente, do aqui-e-agora. Estamos ali, mas não estamos. O corpo está ali, mas a mente vagueia.  

Isso nos leva a perder a vida. Enquanto toda a nossa vida deveria ser um grande esforço para vivermos o presente, para vivenciarmos os detalhes, as nuances ao nosso redor... enquanto deveríamos desenvolver nossa percepção ao ponto de estarmos alinhados com o momento, afinados e sensíveis ao que ocorre junto de nós, estamos, ao contrário, cada vez mais dispersos, divididos, alienados. 

Ontem, uma grande amiga escreveu-me dizendo que estava se despedindo do Facebook. Caiu em si que não estava dando conta e não queria aquilo perturbando a mente dela. Apresentei meus parabéns. Farei a mesma coisa breve.

E hoje, ao abrir esse mesmo Facebook, dei de cara com a excelente matéria a seguir, que vale a pena ler. E refletir. O que estamos realmente fazendo com as nossas vidas? Estamos virando idiotas obcecados por uma telinha de celular? "E que mundo é esse que parece já não surtir tanta graciosidade sobre os nossos olhos, que buscamos tão fervorosamente escapar, distraindo-nos?" - pergunta a autora do texto em questão. 

Reproduzo a matéria a seguir.
Do homem no celular que não viu a baleia passar e o retrato de nossos tempos



(Texto de Grace Bender publicado originalmente em Conti Outra - www.contioutra.com)

Há alguns dias li uma curiosa matéria publicada no site O Globo sob o título: “Homem não vê baleia que passou do seu lado porque estava enviando mensagens no celular” (leia aqui). De acordo com o texto, o rapaz em seu veleiro perdeu um verdadeiro espetáculo da natureza: uma enorme baleia jubarte passando a pouquíssimos metros da embarcação.

Confesso que quando passei o olhar ligeiramente sobre a chamada, pensei que devesse se tratar de apenas mais uma das diversas notícias duvidosas ou falaciosas que comumente circulam pelas redes sociais. Não era possível! Como um homem não poderia perceber uma visita nada discreta e tão rara?

Ao que tudo indica sim, é possível. A Aldeia Global de McLuhan parece realmente ter se esfacelado. Ou não: ao mesmo tempo em que parecemos estar todos mais próximos, seja por whatsapp, facebook, skype, sms, etc., paradoxalmente estamos nos afastando do momento presente e de tudo aquilo que acontece ao nosso redor. São os dois lados de uma mesma moeda, consequência da dinâmica de globalização tecnológica.

De fato, já podemos observar uma geração de jovens cada vez mais desinteressada e apática. Se por um lado testemunhamos uma era de co-presença virtual dos indivíduos, a era dos humanos ligados ao instante, por outro podemos observar o surgimento de um ser humano cada vez mais distante e indiferente, em outras palavras, insípido. Este novo ser está tão conectado (ao mundo online) que acaba por se desconectar de sua própria realidade concreta e palpável, acontecendo exatamente no seu entorno, a cada instante e minuto.

E o que pode acontecer em um minuto? Bem, em um minuto podem ser postadas 72 horas de vídeo no YouTube, enquanto 204 milhões de e-mails chegam aos seus destinatários e 350 GB de dados são recebidos pelos servidores do Facebook… ou pode passar uma baleia ao seu lado (se estiver em alto mar, é claro). De qualquer forma, estes foram os dados angariados pela Qmee, empresa de consultoria norte-americana, e diz respeito a uma parte do que acontece pela internet afora enquanto em um minuto um evento precioso pode passar despercebido.

E assim a vida transcorre de minuto a minuto. As informações coletadas nos revelam que estamos deixando a vida passar enquanto ficamos hipnotizados pelo visor e por uma exacerbada interação a distância. Não sei se foi exatamente este o caso do rapaz que perdeu a chance extraordinária de experimentar a real sensação de estar lado a lado com um dos maiores animais do planeta.

Não há como tirar conclusões, muito menos julgar a atitude do homem no veleiro como certa ou errada. Mas faz pensar sobre as consequências da extrema conectividade que parece estar suplantando o interesse pelas coisas mais simples do mundo. E que mundo é esse que parece já não surtir tanta graciosidade sobre os nossos olhos, que buscamos tão fervorosamente escapar, distraindo-nos?

Reinventar a graça do mundo é reinventar o olhar, é abrir-se sensivelmente para a realidade que o cerca ao enxergá-la como se fosse pela primeira vez. Você poderá se surpreender!

(Nota da Conti outra: o texto acima foi publicado com a autorização da autora.)


Encerro esta crônica repetindo - porque é bom reler - a autora:

"Reinventar a graça do mundo é reinventar o olhar, é abrir-se sensivelmente para a realidade que o cerca ao enxergá-la como se fosse pela primeira vez."

Reinventemo-nos, por misericórdia. Isto é o mais urgente a se fazer.

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