"Algo que ocultávamos nos enfraquecia, até percebermos
que esse algo éramos nós mesmos.” – Robert Frost
Volto a falar sobre este tema, a sombra, por considerar o
trabalho com a própria sombra, para o buscador do conhecimento supremo (o
conhecimento de si mesmo), muito mais produtivo e revelador do que qualquer
outra prática espiritual, seja ela qual for.
O que é a sombra?
“Por sombra, quero dizer o lado ‘negativo’ da personalidade, a soma de todas aquelas qualidades desagradáveis que preferimos ocultar, junto com as funções insuficientemente desenvolvidas e o conteúdo do inconsciente pessoal.” (Jung, num dos seus ensaios sobre a psicologia do inconsciente).
“Nossa sombra é feita de pensamentos, emoções e impulsos
que julgamos excessivamente dolorosos, constrangedores ou desagradáveis de
aceitar. Portanto, em vez de lidar com eles, nós os reprimimos – e os lacramos
em alguma parte de nossa psique, para que não seja preciso sentir o peso e a
vergonha que carregamos por conta deles.” (Debbie Ford)
Self inferior, eu
reprimido, alter ego, id. Muitas são as denominações. Para começo de
conversa: tudo aquilo que tem substância tem sombra. Nosso ego faz um
contraponto com a sombra, da mesma forma que a luz faz um contraponto com as
trevas. Por mais que nos julguemos perfeitos, por mais que tentemos fechar os
nossos olhos internos, todos nós temos, sim, uma sombra. Não queremos olhar
para ela porque ela assusta, é feia, e não queremos que desmorone a nossa autoimagem
tão cuidadosamente elaborada ao longo do tempo... imagem erguida com nosso
suor, nosso sangue, nossas lágrimas.
As descobertas sobre a sombra começaram com os estudos de
Freud e Carl Jung. Bem-humoradamente, Jung disse que, de forma intuitiva, todos
nós compreendemos o significado das expressões sombra, personalidade
inferior ou alter ego. E que, se
por acaso alguém esqueceu, “sua memória pode ser facilmente refrescada por um
sermão de domingo, por sua esposa ou pelo coletor de impostos”. Sim, um simples
coletor de impostos pode ser a “topada” que deflagra o pior que há em nós.
“Puxa, eu estava tão bem... tinha acabado de fazer minha
meditação, ao som de uma música celestial... e aí alguém tocou a campainha e me
entregou um envelope. Era um aviso de multa. Que droga! Espumei de raiva e
soltei até um palavrão!” E num segundo, toda a “paz” e todo “amor” trazidos
pela meditação foram eclipsados pelo “filho da... que tá querendo meter a mão
no meu bolso!”
Topadas são testes reveladores da sombra que guardamos a
sete chaves para que ninguém veja. Mostrando que aquela “paz” não era, ainda, a
Paz, ou seja, aquele estado de equanimidade mental propalado pelos mestres,
onde os eventos externos perdem o seu poder de nos afastar do equilíbrio
interno.
Quer tenhamos consciência disto ou não, o Poder Divino,
ou Amor Cósmico Universal, ou Eu Superior (chame-o como quiser), está nos
movendo em direção à Luz. Quando a parte mais densa da nossa personalidade
reage e empanca, as topadas aparecem. As topadas da vida vêm de muitos lados, e
são uma fonte educativa. Elas vêm para nos dar um reimpulso em direção à Fonte
Cósmica de onde viemos. As topadas nunca deveriam ser vistas como empecilhos e
sim como oportunidades de autoconhecimento e evolução espiritual.
Sem autoconhecimento não há espiritualidade, só
pseudo-espiritualidade. E caminhos para o autoconhecimento são inúmeros, mas
nenhum deles será eficiente enquanto não decidirmos enfrentar a nossa sombra. Nenhum
deles será de ajuda enquanto alimentarmos essa bolha de ilusão que nos leva a
acreditar que somos justos e perfeitos e não temos sombra.
O trabalho com a
sombra nos liberta da consciência de manada e conduz a vida neste planeta a uma
vibração mais elevada, deixando para trás este jardim da infância das emoções.
Como olhar para si mesmo é uma tarefa extremamente árdua,
a maioria de nós prefere adiá-la. É mais fácil enveredar por essa miríade de
caminhos espirituais que alimentam o autoengano e nos mantêm engaiolados, seguindo o pensamento dos outros como ingênuos cordeirinhos; é mais fácil continuar com o dedo
apontado para fora; é mais fácil continuar alimentando e multiplicando esse gigante
e assustador festival de superficialidades que é a nossa sociedade
contemporânea.
Temos medo do material escuro que escondemos dentro de nós mesmos, por isso optamos por negá-lo. No entanto, o monstro assustador só faz crescer, porque a sombra negada individualmente é agregada à sombra negada de todas as pessoas, transformando-se numa descomunal sombra coletiva. E a grande sombra coletiva se materializa em quê? Em sofrimento, desarmonia, intrigas, guerra, caos. O poder destrutivo da sociedade de massa é imenso. Aí está a História para comprovar, com seus massacres e horrores. E com a manipulação global dos grandes grupos em prol de interesses econômicos obscuros.
Temos medo do material escuro que escondemos dentro de nós mesmos, por isso optamos por negá-lo. No entanto, o monstro assustador só faz crescer, porque a sombra negada individualmente é agregada à sombra negada de todas as pessoas, transformando-se numa descomunal sombra coletiva. E a grande sombra coletiva se materializa em quê? Em sofrimento, desarmonia, intrigas, guerra, caos. O poder destrutivo da sociedade de massa é imenso. Aí está a História para comprovar, com seus massacres e horrores. E com a manipulação global dos grandes grupos em prol de interesses econômicos obscuros.
Esse poder, entretanto, é nada em comparação à Luz.
Acenderemos o interruptor interno para enxergar as nossas trevas? Ou
continuaremos imersos na ilusão de que somos invariavelmente bons e as guerras nada têm a ver
conosco e sim, com "os outros"?
(Vale aqui um adendo: devemos compreender por guerra não
somente acionar uma metralhadora ou uma bomba atômica. Guerra é tudo aquilo que
nos faz desviar o olhar do nosso irmão; é a falta de compreensão com quem está
perto; a insensibilidade diante do sofrimento; a frieza diante das injustiças; os maus pensamentos: a mente sem controle, a nos enredar em julgamentos e superficialidades).
“Sombra, eu?” – sussurra o ego. “Eu só faço o bem, sou
uma pessoa amorosa, justa, fico aqui no meu canto...”
Deepak Chopra diz: “Se você não pode enxergar a própria
sombra, precisa procurá-la. A sombra se esconde na vergonha, nos becos escuros,
nas passagens secretas e nos sótãos fantasmagóricos de sua consciência. Ter um
lado sombrio não é possuir uma falha, mas ser completo”.
Ressaltando: "Ter um lado sombrio não é possuir uma falha, mas ser completo".
“Lidar com a nossa sombra é algo complexo, porém, é uma
jornada garantida de volta ao amor. Não apenas o amor pelos outros, mas o amor
por cada característica que vive dentro de você e dentro de mim – um amor que
nos permite abraçar a riqueza de nossa humanidade e a plenitude de nossa
divindade”, explica Debbie Ford. Ela também diz:
“Onde não há amor, há medo. E o medo, depois de se
apossar da mente, é como um vício que ameaça esmagar a alma. Então, é essa
coisa que chamamos de sombra. Ela não aparece na vida da maioria de nós; é um
fogo gigantesco, mas arde como brasa lenta. É você, ao fazer uma afirmação
tola, magoando alguém que ama e possivelmente arruinando um relacionamento. Ou
você, quando faz algo imbecil que sabota a carreira profissional. Ou você, ao
pegar um drinque, sabendo que é alcoólatra e que, se continuar, isso vai
matá-lo. Em outras palavras, é aquele você, dentro de você, que não deseja seu
bem. É a sombra, e ela só pode ser eliminada se você deixar brilhar a sua luz.
(...) Quando estamos vivendo em alinhamento com o self verdadeiro, conforme
Deus nos criou, recebemos amor constantemente, e o estendemos da mesma forma
como o recebemos. Isso é o que significa viver na luz.”
Hércules |
Podemos adiar o quanto quisermos. Podemos continuar na
prisão do medo, podemos encontrar conforto na bolha ilusória que muitas
religiões oferecem, podemos perpetuar nossa ignorância abissal sobre nós mesmos
através do velho hábito de refletir no outro nossos problemas e nossas
insatisfações. Mas chegará o dia, cedo ou tarde, em que, a exemplo de Hércules,
teremos de lavar nosso próprio estábulo.
Feito isto, viveremos na luz e
compreenderemos, finalmente, que somos todos um e nada temos a temer, pois a luz daquele que desperta é
capaz de iluminar o universo inteiro.
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