Diz-me cá, por favor: o que achas tu mais justo, seres tu a obedecer à natureza ou a natureza a ti? Que diferença faz sair mais ou menos depressa de um lugar de onde temos mesmo de sair?
Não nos devemos preocupar em viver muito, mas sim em viver plenamente; viver muito depende do destino, viver plenamente, da nossa própria alma.
Uma vida plena é longa quanto basta; e será plena se a alma se apropria do bem
que lhe é próprio e se apenas a si reconhece poder sobre si mesma. Que
interessa os oitenta anos daquele homem passados na inacção? Ele não viveu,
demorou-se nesta vida; não morreu tarde, levou foi muito tempo a morrer!
"Viveu oitenta anos!". O que importa é ver a partir de que data ele
começou a morrer. "Mas aquele outro morreu na força da vida". É
certo, mas cumpriu os deveres de um bom cidadão, de um bom amigo, de um bom filho,
sem descurar o mínimo pormenor; embora o seu tempo de vida ficasse incompleto,
a sua vida atingiu a plenitude.
"Viveu oitenta anos". Não, existiu durante oitenta anos, a menos que digas que ele viveu no mesmo sentido em que falas na vida das árvores. Peço-te insistentemente, Lucílio: façamos com que a nossa vida, à semelhança dos materiais preciosos, valha pouco pelo espaço que ocupa, e muito pelo peso que tem. Avaliemo-la pelos nossos atos, não pelo tempo que dura.
"Viveu oitenta anos". Não, existiu durante oitenta anos, a menos que digas que ele viveu no mesmo sentido em que falas na vida das árvores. Peço-te insistentemente, Lucílio: façamos com que a nossa vida, à semelhança dos materiais preciosos, valha pouco pelo espaço que ocupa, e muito pelo peso que tem. Avaliemo-la pelos nossos atos, não pelo tempo que dura.
Queres saber qual a diferença entre um homem enérgico, que despreza a fortuna,
cumpre todos os deveres inerentes à vida humana e assim se alça ao seu supremo
bem, e um outro por quem simplesmente passam numerosos anos? O primeiro
continua a existir depois da morte, o outro já estava morto antes de morrer!
Louvemos, portanto, e incluamos entre os afortunados o homem que soube usar com
proveito o tempo, mesmo exíguo, que viveu. Contemplou a verdadeira luz; não foi
um como tantos outros; não só viveu, como o fez com vigor.
Séneca, in 'Cartas a Lucílio'
Séneca, in 'Cartas a Lucílio'
Nenhum comentário:
Postar um comentário