sexta-feira, 16 de maio de 2014

Consumo e Violência

"Viver no mundo e não ser do mundo", como falam os grandes mestres, é ser livre. É sair da gaiola do sistema e voar! É refletir, é não ser escravo do consumo.

“Eu me utilizo de todos os meios da Sociedade de consumo, penetro no Sistema, mas como um veneno.” – Raul Seixas

“Quando começou a comprar almas, o diabo inventou a sociedade de consumo.” – Millôr Fernandes

“No passado, penso; logo, existo.
No presente, nem penso; logo consumo.
No futuro, penso por quê?” -
Anita Prado

A violência urbana é um dos fatores mais preocupantes da nossa época. Em muitos lugares, basta que surja uma chance para que aflore abruptamente, de forma primitiva e selvagem.

A greve da polícia, em Pernambuco, neste mês de maio, deu origem a diversos saques a lojas, onde se podia ver não somente bandidos, mas pessoas do povo, mulheres e até crianças, roubando descaradamente os estabelecimentos.

Qual a causa desse vandalismo? 

Estava lendo uma entrevista antiga, onde o sociólogo polonês Zygmunt Bauman (influente acadêmico europeu, considerado um dos mais importantes sociólogos da atualidade), ao comentar os distúrbios ocorridos em Londres em 2011, afirma: "Foi um motim de consumidores excluídos". Bauman disse que a revolta foi motivada mais pelo desejo de consumir do que por qualquer outra preocupação com mudanças sociais. Desigualdade social e ânsia de consumo foram, segundo o sociólogo, os ingredientes-chave para os saques e motins.

O homem caiu na própria armadilha. Estamos nos engaiolando cada vez mais nesse sistema que ordena "compre", "consuma", ininterruptamente. Essa corrida aos bens materiais, desacompanhada de valores espirituais e familiares, só pode desaguar em desastre. Não por acaso, recebi ontem uma reflexão do escritor Mario Vargas Llosa, onde ele diz: 

“Uma democracia sem uma vida espiritual converte-se numa selva em que os lobos comem todos os cordeiros. E, para que a cobiça e a ambição material não regulem a vida, é preciso alimentar a vida espiritual.” 

Os valores humanos, ou valores espirituais, não caem de moda e são o sustentáculo de uma sociedade harmoniosa e pacífica. Será que diante dessa realidade tão contundente que vemos desfilar nas nossas TVs, ainda acreditamos que esse modelo materialista-consumista criado por nós tem solução?

Outro dia, assisti a uma palestra de um deputado com rara visão social. Discorrendo sobre a violência, ele mostrou, com dados estatísticos da ONU, que a violência social não pode ser explicada simplesmente pela pobreza, uma vez que países como a Índia, com uma desigualdade social imensa, ostenta índices de criminalidade bem inferiores aos índices de países ricos, como é o caso dos Estados Unidos. Qual a explicação? A explicação é que a sociedade indiana tem dentro de si, os arraigados e seculares valores espirituais. 

A nossa falta de valores, o nosso descaso em repassar valores e a nossa permissividade com as nossas crianças, tudo isto somado à desigualdade social, está nos consumindo. O consumo nos consome, sem dúvida alguma. "Quando as massas não mudam, elas se movem na direção da destruição", disse o educador Robert Happé. 

Nosso bem-estar, nossa paz e nossa harmonia estão onde sempre estiveram: dentro de nós. Mas nos perdemos dessa certeza, esquecemos das verdades do espírito e agora vagamos nessa corrida inglória, acreditando que a felicidade está nos bens de consumo. Nosso modelo "perfeito" de sociedade é o modelo americano. Por mais que os países pobres possam tentar, jamais conseguirão chegar ao modelo americano, por uma simples razão: esse modelo é tão selvagemente consumista, exaure de tal forma os recursos, que seriam necessários vários planetas Terra para que todos chegassem a esse padrão dos Estados Unidos. Bastaria esta reflexão para nos tirar da ilusão.

Sem dúvida alguma, mais do que nunca precisamos repensar a nossa vida. O mundo todo clama por mudança. Esta gaiola de loucos onde nos metemos tem saída, a porta parece fechada, mas está aberta àqueles que ousam refletir e mudar. E mudar não é fácil, porque dói. Mudar requer coragem. Requer mudança de foco. Requer um olhar para dentro. No entanto, mudar de foco, olhar para dentro e mudar, por mais que doa, é inadiável. Não existe outro caminho.

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